quinta-feira, janeiro 10, 2019

LEITURAS

«...É aqui, com efeito, que reside uma das grandes e maravilhosas características dos livros (e que nos fará compreender o papel simultaneamente essencial e limitado que a leitura pode desempenhar na nossa vida espiritual) que para o autor poderia chamar-se “Conclusões” e para o leitor “Iniciações”. Sentimos perfeitamente que a nossa sensatez começa onde acaba a do autor, e gostaríamos de que ele nos fornecesse respostas, quando tudo quanto ele pode fazer é dar-nos desejos. E esses desejos, ele só consegue despertá-los em nós fazendo-nos contemplar a beleza suprema à qual o último esforço da arte lhe permitiu ter acesso.»
Marcel Proust, in O Prazer da Leitura



É comum dizer-se que a aventura da escrita é, na sua essência, um acto de solidão porque, mesmo que incorpore uma multidão de personagens, ela nasce sempre de um local profundamente solitário, que é a mente do escritor. Porém, a escrita não pode ficar presa nas introspecções que a geraram sob pena de, não se libertando, se imolar no isolamento. Talvez por isso tenha escolhido citar Marcel Proust porque entendo, à primeira, o alcance das suas palavras quando se dispõe a transmitir-me a ideia de lucidez analítica tão necessária em cada obra, a sua racionalidade emocional, o seu espaço temporal e o seu ponto de partida e de chegada, hiperbolizada na mente solitária do autor e que nunca corresponde à imagética reflexiva do leitor, generosamente disposto a conceder-lhe a desejada libertação.
É um risco que assumo ao citar, neste contexto, o grande pensador francês. Risco porque, não sendo esta prosa uma obra de valor literário puro (trata-se de uma narrativa de vida), não cabem aqui reflexões literárias profundas e porque, sendo eu um cidadão em busca da certificação secundária (embora com fortes ligações à literatura), estou longe da genialidade que me conceda autoridade para opinar sobre a escrita. Finalmente, um risco porque ao pretender, com esta reflexão, drenar o elemento emocional de uma narrativa que foi muito emotiva na sua fase de produção, poderei vir a esvaziá-la do conteúdo pragmático necessário à avaliação a que está submetida, com esta ideia de a vulgarizar.
É quase certo que nenhuma destas linhas se libertará do enredo da minha mente mas, por precaução, aqui deixo o apelo à compreensão de quem ousar a leitura, pelos lapsos que encontrar.
E por fim a insegurança de saber se esta introdução terá sido uma boa ideia. Seguramente que não sei! Obterei a confirmação quando estes escritos forem submetidos a apreciação.
Decidi ainda introduzir alguns diálogos no discurso directo para não tornar o texto ou demasiado cansativo ou demasiado monótono. Também tive a intenção de escrever para uma leitura veloz e fluida, que é como eu gosto de ler. De rompante. Tê-lo-lei conseguido?
Fundamentalmente, o que quero é que quem me vier a ler entenda, na íntegra, qual foi o meu percurso de vida porque é disso que trata, afinal, esta narrativa.